Estudo da FHDSS-Franca aponta que ausência
dos pais prejudica tranmissão de valores morais aos filhos

A competitividade profissional, aliada à economia de consumo, está abalando as relações familiares e contribuindo para que os pais releguem à escola a tarefa de educar os filhos. Isso compromete a transmissão às crianças e aos jovens de valores como solidariedade, respeito ao próximo, fidelidade e senso de justiça. Esta é a conclusão do trabalho de doutorado realizado pelo professor Mário José Filho, do Departamento de Serviço Social da UNESP, câmpus de Franca, que estudou as relações de famílias de classe média de todo o país. A partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que revelam a predominância de casias com filhos como modelo de arranjo familiar, o pesquisador centrou seu estudo na classe média.

A pesquisa do docente foi realizada com cem casais, dos quais 86 responderam a um questionário com 58 questões. Os temas abordados foram: vida social e política, valores, planejamento e relacionamento familiar e educação dos filhos. Entre esses casais, 74% possuíam renda familiar acima de 18 salários mínimos; 93% residiam em casa própria; 82% estavam casados há mais de 18 anos; e tinham, em média, três filhos. Quanto ao grau de escolaridade, 70% dos homens e 48% das mulheres concluíram pelo menos um curso superior.

A pesquisa quantitativa revelou que 96% dos casais acreditam ser responsabilidade dos pais a educação dos filhos. No entanto, pelo fato de quase metade deles (48%) trabalharem fora, sobram-lhes pouco tempo para estar em companhia dos filhos. Os homens (44%) revelaram reservar até três horas semanais para ficar com eles. Igual número de mulheres afirmaram que, no decorrer de uma semana, dedicam acima de seis horas aos rebentos.

Como conseqüência, a pesquisa, intitulada "A família como espaço privilegiado para a construção da cidadania", apontou também o descontentamento dos pais com o tempo que afirmaram ficar com os filhos: 49% dos homens e 44% das mulheres têm a certeza de que eles exigem muita atenção e paciência. Mas a necessidade de trabalhar e a incompatibilidade de horários dificultam a convivência familiar. Para completar, mesmo quando estão junto aos filhos, a convivência nem sempre os satisfaz.

O pesquisador Mário José Filho também reuniu os entrevistados para discutir os temas do questionário. Ele explica que esses encontros resumem uma técnica complementar de pesquisa, chamada de reunião focal, que serve para valorizar a abordagem qualitativa. Neles, os casais fizeram seu mea culpa. Eles acreditam que existe um descompasso entre o que eles ensinam e o que os filhos vêem de fato.

"Hoje se exige demais que eles sejam honestos, mas o que observam é a corrupção generalizada entre os meios políticos e a falência das instituições públicas," diz um dos pais. Outro abordou a questão do maniqueísmo. "Antigamente, nas histórias, passava-se a idéia do triunfo do bem sobre o mal. Havia mocinho e bandido, e o bandido sempre era punido. Hoje a mídia mostra o contrário disso. E é um pecado que uma criança veja tudo isso sem ter quem a esclareça". E mais, "atualmente a pessoa honesta é rotulada de otária e o indivíduo burro e mau é quem sempre arranja uma maneira de levar vantagem". Se, na sociedade moderna, tudo é permitido, "por que alguns jovens são violentos, assaltam e matam e por que ocorrem brigas e mortes em escolas?", reflete o professor Mário José.

Mesmo diante de situações adversas, a família precisa estar atenta para exercer sua responsabilidade na formação de cidadãos comprometidos com o meio em que vivem. "É no núcleo da família que a criança aprende a ser tolerante e a desenvolver ações de cidadania, de solidariedade, de fraternidade e senso de justiça". Para o docente, o papel da escola é apenas o de transmitir instrução complementar e permitir que a criança exercite sua cidadania. Os pais pesquisados concordam. Eles acreditam que os valores éticos e mais amplos não se aprendem na escola. É atribuição da família ensiná-los.

Assim, eles também admitem que é no ambiente familiar que devem ser estimuladas ações de amor e cumplicidade e abolidas atitudes de repressão e violência. A base para se conseguir uma boa convivência, mesmo que os pais passem boa parte do tempo no trabalho, é discutindo com as crianças situações do cotidiano. Os pais entrevistados revelaram que se esforçam para isso. Entre eles, 91% costumam discutir com os filhos aspectos positivos e negativos dos diversos temas abordados pela televisão.

Professor Mário José Filho - Departamento de Serviço Social
Tel: (16) 623-7067


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