Grupo de Pesquisa do IGCE-Rio Claro aponta
presença de radioatividade no aqüífero do Guarani

Por Brenda Guimarães Marques

IlustraçãoAs preocupações que tangenciam os recursos hídricos, do ponto de vista qualitativo e quantitativo, tem levado determinados agentes do campo científico, político e civil a buscarem respostas e soluções para os problemas que afetam o abastecimento de água potável e ameaçam a saúde da população.

Conforme indica a ABAS (Associação Brasileira de Águas Subterrâneas), o Brasil possui um subsolo privilegiado, com 112 trilhões de metros cúbicos de reservas em águas subterrâneas.

Neste contexto, o manancial de águas subterrâneas referente ao Aqüífero Guarani tem sido objeto de estudos científicos, visando tanto a sua preservação quanto a elaboração de diagnóstico necessário para assegurar sua potabilidade e apontar a necessidade de prévio tratamento.

O Aqüífero se estende por uma área de 1,2 milhão de quilômetros quadrados, dois terços dela na Brasil e o restante no noroeste da Argentina, leste do Paraguai e norte do Uruguai. O manancial é estimado em 1 mil quilômetros cúbicos de água doce.

Segundo estimativas, milhares de poços tubulares captam águas do Aqüífero Guarani, alguns apresentando profundidade superior a 1 mil metros. Cerca de 200 municípios paulistas são abastecidos pelo aqüífero, que utilizam suas águas para consumo, recreação, irrigação agrícola e indústrias de alimentos e têxtil, dentre outras.

Do ponto de vista quantitativo, existe abundância de água no aqüífero, mas, a sua utilização deve ser planejada, pois, a captação desregulada e irracional de suas águas pode ocasionar inúmeros problemas, por exemplo, a acomodação do terreno. É por este motivo que diversas investigações tem sido conduzidas no aqüífero, visando reunir o maior número possível de informações que propiciem um adequado uso de suas águas e apropriada gestão.

Desde 1991, o Grupo de Pesquisa "Hidroquímica e Radioatividade na Geosfera", coordenado por Daniel Marcos Bonotto, professor de Geoquímica do Instituto de Geociências e Ciências Exatas da Unesp (IGCE), campus de Rio Claro, e integrante do Projeto ACQUA-UNESP, da PROEX, tem se dedicado a investigações radiométricas do aqüífero Guarani.

As pesquisas envolveram a coleta e análise química, por três vezes, de 80 amostras de águas subterrâneas de poços tubulares que interceptaram o aqüífero, em quase 70 municípios dos Estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Projetos como o "Comportamento Geoquímico do Radônio em Águas Subterrâneas da Bacia Sedimentar do Paraná" e o "Rádio no Aqüífero Guarani" contaram com o apoio de instituições como o CNPq, a FAPESP, e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), sediada em Viena, que liberaram recursos para o seu desenvolvimento, incluindo um investimento de US$ 47,7 mil para a compra de equipamentos e modernização de laboratório.

Os resultados das pesquisas realizadas apontaram a ocorrência de teores excessivos de elementos radioativos, como rádio e radônio, em diversos poços do Guarani. Para o pesquisador, esses elementos quando ingeridos com a água em concentrações que ultrapassam as máximas permitidas podem provocar câncer pulmonar e estomacal.

No caso do urânio, o pesquisador Bonotto constatou que a radioatividade medida nas 80 amostras de água analisadas é bem inferior ao nível máximo recomendado, o que atesta a potabilidade da água em relação aos isótopos de urânio 238 e 234.

"Na água de um poço de 124 metros de profundidade, usado para abastecimento pela SABESP - Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, foi identificada a presença excessiva de cádmio, metal pesado considerado cancerígeno", informa Bonoto.

"As análises diagnosticaram que, em alguns poços, os teores de rádio são superiores ao limite máximo estabelecido pela legislação internacional. Bonotto adverte que o rádio apresenta um alto grau de radiotoxicidade, com tendência de fixar-se nos ossos. Segundo ele, a máxima concentração de rádio-226 nas águas, sugerida pela Organização Mundial de saúde (OMS), é de 1 becquerel por litro (Bq/l), tendo sido constatado que o teor desse radionuclídeo num poço em Catanduva é de 1,8 Bq/l, quase 2 vezes acima do nível permitido pela legislação internacional", complementa o pesquisador.

O docente afirma que os dados referentes ao alto teor de rádio-226, em algumas localidades, comprometem o uso das águas do Aqüífero Guarani para consumo humano. "Desta forma, torna-se necessário um controle radiométrico efetivo, a ser realizado por órgãos sanitaristas e responsáveis pela distribuição da água, devendo ser assinaladas as regiões onde o uso da água é desapropriado para consumo humano", diz.

Na maioria dos poços analisados, Bonotto encontrou níveis elevados de radônio, com destaque para os poços de Maringá (3.303 pCi/l), Londrina (2.453 pCi/l) e Cornélio Procópio (2.408 pCi/l). Porém, as águas destes poços não são utilizadas para consumo humano, apenas para fins industriais e de recreação.

Segundo o pesquisador, o radônio é um gás radioativo que se desintegra emitindo partículas alfa. "Como o tempo de sua vida é relativamente curto, pode ocorrer que o gás contido na água já tenha desaparecido quando ela vem a ser consumida. Além disso, em muitos casos, ocorre o processo de aeração durante o bombeamento, o que diminui os teores de radônio, e elimina os riscos da radiação", explica.

Porém, Bonotto alerta que pode restar na água o chumbo radioativo. "Para averiguar mais detalhadamente esta possibilidade, o CNPq e a FAPESP estão atualmente financiando o Projeto 'Os descendentes do radônio no Aqüífero Guarani'", finaliza.


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