O papel social dos professores universitários

Por Luciana Massi

Prof. Dr. Miguel Jafelicci JúniorO Prof. Dr. Miguel Jafelicci Júnior atualmente é Vice-Diretor do Instituto de Química da Unesp (IQ), campus de Araraquara, membro da Congregação, presidente da Comissão Permanente de Extensão Universitária (CPEU), Coordenador Administrativo do Curso Unificado do Campus de Araraquara (CUCA) e coordenador do projeto Palestra na Escola - no qual participa também como palestrante.

Foi um dos primeiros coordenadores do Grupo Alquimia, e permaneceu como tal durante 9 anos. Faz pesquisas em físico-químicas de colóides e de superfície e também de química de materiais, estudando dispersões coloidais de óxidos metálicos que evolui para química de materiais cerâmicos principalmente com propriedades magnéticas.

Ultimamente, orienta a primeira tese em materiais metálicos magnéticos para fins de gravação magnética. Em entrevista exclusiva concedida ao Informativo Proex, Jafelicci relata a sua visão da universidade e do professor universitário, focando o papel social dos docentes que atuam nas áreas de pesquisa, ensino e extensão, e também trata da sua experiência enquanto professor do Instituto de Química.

IP - Qual o papel da universidade na sociedade?

Miguel Jafelicci - Na estrutura social atual, a universidade cada vez mais é exigida para atuar como centro de pensamento, criadora de opinião e formadora de profissionais que possam contribuir efetivamente para o desenvolvimento de um país. Assim, no âmbito da estrutura da universidade e sua relação com a sociedade, os setores mais diretamente ligados aos resultados almejados são os da educação, para transformar os cidadãos em profissionais capazes de contribuir para o desenvolvimento da nação; os da cultura, preservando e incentivando a memória da sociedade e do país; os setores produtivos, industriais e comerciais, para o desenvolvimento econômico e social.

Setores mais ligados com a economia e o desenvolvimento industrial das nações, tanto no âmbito governamental público quanto no setor privado, reúnem uma série de problemas que, em princípio, têm a universidade como o seio gerador de soluções.

Nesse contexto, junto com o ensino e pesquisa, a extensão constitui a terceira sustentação da universidade, que é a ação da universidade em benefício da sociedade. A sociedade torna-se o gerador dos temas de pesquisa e a extensão é o difusor do conhecimento construído a partir dos problemas oriundos da sociedade. Nesse contexto portanto, o professor universitário é o ator principal nas ações de ensino, pesquisa e extensão que dinamizam a universidade como o cérebro pensante dos problemas sociais que dissemina as soluções através da extensão universitária à todos os órgãos públicos e privados, mantendo convênios com empresas e instituições ligadas à políticas públicas.

IP - Como se dá a atuação do professor dentro da Universidade?

MJ - O professor universitário é o autor intelectual e ao mesmo tempo o ator das ações que fundamentam o papel da universidade para a nação. Professa o conhecimento difundindo à sociedade a ciência, o saber, estimulando outros pensadores a atuarem pelo desenvolvimento social.

Como autor do processo do saber idealiza pela pesquisa dos diferentes temas, das diferentes áreas de atuação e de interesse da universidade com a criatividade para construir o conhecimento de cada área de atuação. O professor é também o ator na medida que além do pensar, do idealizar, atua na transmissão do conhecimento para difundir idéias, formar novos pensadores capazes de dar nova continuidade à arte da criação e assim dinamizar o processo educacional , o processo de transformação social com vistas ao progresso e ao desenvolvimento da nação.

Assim, o professor universitário tem no seu papel social a necessidade de reunir pesquisa e ensino de maneira sistematizada para devolver os benefícios à sociedade. Algumas civilizações tiveram o professor, o cientista, como o consultor dos governantes para ações políticas, ações ligadas a estratégias (sobretudo de defesa do reino), assim como ações para melhorar a produtividade de alimentos para a sociedade.

IP - Porque a universidade deve praticar a extensão universitária?

MJ - A universidade enquanto instituição organizacional da estrutura pensante da nação não pode se perder nas ações executoras de seus projetos. Essas ações têm que ser estendidas à sociedade através dos diferentes organismos e instituições para que possam executar os resultados alcançados pela sociedade, assim a universidade requer junto uma ação de parceria entre os seus professores e as estruturas sociais, governamentais e privadas, no sentido de estender benefícios através da extensão universitária uma das bases da estrutura da universidade nos diferentes países qual seja pesquisa, ensino e extensão universitária. o Professor tem o seu papel social assegurado qual seja de difundir o conhecimento, professar a verdade baseada no método científico, cada um dentro da sua área de atuação e conhecimento.

IP - Quais as ações de extensão do Instituto de Química da Unesp de Araraquara (IQ)?

MJ - O IQ tem uma atuação na extensão universitária enfatizando o papel da universidade através dos diferentes projetos de extensão universitária. Esses projetos relacionam-se à educação, através da difusão da ciência no Centro de Ciências de Araraquara, nas palestras ministradas por professores e pós-graduandos através do projeto Palestra na Escola atendendo as escolas de Ensino Médio, levando temas científicos complementares às aulas das matérias ensinadas aos estudantes, preferencialmente na escola pública.

Uma outra forma de disseminar a importância do ensino de química e do profissional Químico é através do Grupo Alquimia, um grupo de alunos coordenados por 1 professor para levar de uma forma artística os conceitos de química e o papel da química no cotidiano do cidadão.

A teatralização com cenas envolvendo o dia-a-dia das pessoas estimulando o interesse pela química, quando são contadas muitas das situações que envolvem conceitos e conhecimentos intimamente relacionados com a química e com a vida. Ainda na área de educação, o projeto Curso Unificado do Campus de Araraquara (CUCA) tem por objetivo preparar os alunos egressos do Ensino Médio para o vestibular, mas que não contam com condições sócio-econômicas adequadas para se dedicarem aos estudos e de competir para os exames de ingresso no ensino superior.

Reunindo alunos dos cursos de graduação para ministrarem as aulas de acordo com os programas dos exames de vestibulares das universidades brasileiras, o CUCA vem atuando há 8 anos permitindo que muitos egressos pudessem conseguir uma vaga na universidade e possam colaborar para também propiciar a outros alunos a mesma oportunidade.

Outros projetos de extensão estão ligados essencialmente com a natureza química da matéria através das análises físico-químicas tais como de solo para fins de fertilidade, água para fins de potabilidade e outros usos na indústria, desenvolvimento de materiais para alguns setores produtivos tais como vidros, produtos naturais, produtos químicos de interesse agrário ou de interesse para medicamentos e outros fins. Recentemente o IQ vem atuando numa ação para garantir a qualidade de combustíveis distribuídos numa região do Estado de São Paulo. Este projeto gerou uma ação de pesquisa, qual seja a construção de um laboratório para desenvolvimento de novos métodos para análise de combustíveis.

IP - Como o professor universitário participa dos projetos de extensão?

MJ - A ação extensionista do professor universitário no âmbito da sua atividade acadêmica e principalmente voltada para o seu papel social está diretamente ligada com a sua atividade de ensino e pesquisa. Naturalmente dessas duas atividades do fazer acadêmico, a atuação na extensão universitária surge como uma prestação de serviços, mas evolui rapidamente para um projeto integrado das ações de pesquisa e ensino no sentido de levar o conhecimento científico à sociedade.

IP - Como o senhor vê os projetos de extensão?

MJ - Ao iniciar a carreira pude perceber que muitos cidadãos vinham à universidade com amostras para que pudessem ser analisadas e conhecidas as respectivas composições químicas de tais amostras para que pudéssemos dar uma solução de aproveitamento e produção daquele material para fins comerciais. Em algumas áreas a extensão se faz como uma assistência social ou um assistencialismo da universidade para com a sociedade. No entanto essa não é a função da extensão universitária única e exclusivamente prestar um serviço assistencialista ou não.

A extensão deve integrar a pesquisa e o ensino para dentro de um contexto social, industrial, as finalidades econômicas, educacionais, culturais e desenvolver uma ação integrada na sociedade e ao mesmo tempo obter outros parâmetros que possam subsidiar, gerar novas pesquisas, novos conhecimentos, novas inserções dentro do contexto de ensino da instituição universidade.

Portanto é importante que os resultados das ações extensionistas sejam também trazidos, como exemplos de aplicação para o âmbito das disciplinas ministradas na ação de ensino das universidades, assim como os resultados de pesquisa também são gradativamente inseridos no contexto do ensino e assim se procede um ensino de melhor qualidade, atualizado, moderno que se relaciona com as ações de pesquisa e extensão que integram todos os objetivos da universidade enquanto formadora de pensamento e de recursos humanos.

IP - Como o senhor, o Prof. Dr. José Eduardo de Oliveira e a Prof. Dr. Marian Rosaly Davolos se tornaram coordenadores do Grupo Alquimia (antes Show da Química)?

MJ - Em 1988 alguns alunos do último ano do curso de bacharel em química trouxeram para o IQ o diagnóstico de suas cidades de origem com relação ao curso superior, à universidade, à carreira do profissional químico e à própria Ciência Química. Trouxeram diagnósticos sobre o desconhecimento da sociedade com relação ao que eles estavam fazendo na cidade de Araraquara, na Universidade Estadual Paulista, no IQ e para que estavam estudando química. Para que servia esse curso que eles estavam estudando.

Esses últimos anistas estavam admirados com o grau de ignorância da sociedade com relação a esses assuntos e nos propuseram organizar temas de química que pudessem ser levados para escolas da cidade e da região no sentido de se difundir a Química no dia-a-dia das pessoas.

No entanto, palestras, ou seminários poderiam ser uma atuação pouco comunicativa para essa finalidade e principalmente para esse público alvo. Daí propuseram se fazer um show de química que foi denominado como Grupo Alquimia. E a proposta desse grupo era teatralizar temas de química dentro do cotidiano das pessoas. Assim pesquisaram durante o ano de 1989 algumas experiências de química que tivessem um efeito visual atrativo (precipitação, formação de substâncias coloridas) que pudessem utilizar da magia da química para atrair a atenção das pessoas.

Com isso propunham explicar o que estava acontecendo ali e o que acontecia em tantas outras situações em que utilizamos produtos químicos em casa. E como aqueles exemplos estavam tão perto do que acontece quando se utiliza produtos de higiene pessoal, higiene doméstica, produtos de limpeza, assim como esses produtos nos ajudavam no trabalho doméstico. Visando ainda mostrar como muitos produtos químicos colocavam em risco nossas vidas por desconhecimento de princípios básicos de química - muitas pessoas se queimam com etanol líquido por não saber do poder de inflamabilidade que tem o álcool, daí a intenção de fabricar álcool em gel que se espalha menos.

O Grupo Alquimia levava, de uma maneira artística, essa imagem da química e da própria educação do cidadão para a sua segurança e qualidade de vida. Desde 1991 o Grupo Alquimia tem trabalhado com peças teatrais que envolvem diferentes situações, colocando a química no centro das atenções em questões ambientais, alimentares, medicinais, em várias situações do cotidiano dos cidadãos.

IP - Qual foi a sua participação no Projeto Curso Unificado do Campus de Araraquara?

MJ - Desde novembro de 2000 assumimos a coordenação desse projeto de extensão que teve início no 2º semestre de 1993 com a ação de alunos da graduação que queriam praticar seu conhecimento com a prática de ensino em sala de aula. Trouxeram a idéia à diretoria, pedindo apenas espaço (sala de aula e estrutura mínima) para se ministrar as aulas. Até 1996 o cursinho teve sua atuação, sua importância, mas também necessitava de uma reestruturação.

A idéia tinha crescido e também os problemas de infra-estrutura, de maneira que em 1997 o cursinho foi reestruturado e foi proposto como um projeto de extensão universitária das 4 unidades, o CUCA passou a ter uma orientação pedagógica através das disciplinas de prática de ensino das áreas de química, ciências sociais, letras e outras áreas do Campus de Araraquara e passou também a ser coordenado pela vice-diretoria do IQ com o apoio das outras vice-diretorias. Hoje o CUCA, que começou com 100 vagas alcança 300 vagas em parceria com a Prefeitura de Araraquara. E a Proex, utilizando do sucesso deste projeto já propõe ao Governo do Estado de São Paulo um projeto para atender 10 mil alunos de cursos comunitários de todos os campi da UNESP.

IP - O senhor participou de mais algum projeto de extensão universitária?

MJ - Em 1987 participei de um diagnóstico do Ensino Fundamental em Araraquara no Núcleo de Ensino do Campus de Araraquara que até hoje funciona na Faculdade de Ciências e Letras. Assim trabalhamos com uma escola de Araraquara - a escola do Melhado - onde fizemos o diagnóstico das condições de ensino, do perfil pedagógico da escola no sentido de, num segundo momento, fazer a intervenção junto com os professores.

O projeto foi muito importante porque reunimos professores das diferentes disciplinas do Ensino Básico e Fundamental para discutir temas de suas disciplinas e a inter relação desses temas com as diferentes disciplinas e percebíamos pelos depoimentos, principalmente, pela participação dos professores a necessidade que eles tinham de interagir com pesquisadores, professores da universidade e assim aumentavam a sua capacidade de atuação na sala de aula, estimulando e motivando os alunos a discutirem temas propostos por nós e previamente discutidos no núcleo de ensino.

Mais tarde participei também de um projeto de educação continuada e formação de professores de ciências que inicialmente seria para Ensino Básico, mas se estendeu ao Ensino Fundamental.

Nesse projeto o Prof. Dr. Luis Antônio de Oliveira reuniu alguns professores e pós-graduandos do IQ para levar na forma de um curso de formação de professores de ciências os conceitos básicos de física e química aos professores que tinham uma grande necessidade de discutir os temas que eles ministravam nas salas de aula e nesse sentido o Curso de Educação Continuada de Ciências ministrado no início da década de 1990 foi muito bem aceito pelas Delegacias de Ensino de Araraquara e região (São Carlos, Taquaritinga, Novo Horizonte, Jaboticabal e outras).

Essa foi uma experiência extesionista muito gratificante e que me demonstrava o papel social do professor universitário atuando na extensão universitária. Salienta-se que os resultados daquele projeto qualificaram o IQ para outros cursos de Educação Continuada e o projeto PROENQ (veja link na página do IQ) foi apoiado pela Pró-reitoria de Graduação visando criar um espaço eletrônico para os docentes organizarem as disciplinas e disponibilizarem para nossos alunos.


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